Nellie Bly, feminista : a aventura do jornalismo

tania navarro swain

Resumo :

Quem é Nellie Bly ? Por que se debruçar sobre sua vida, seus caminhos ?

Era uma mulher de aventura, uma daquelas que desafiou os moldes da domesticidade, que denunciou os crimes cometidos contra as mulheres, uma jornalista, feminista do século XIX, mulher de ação. Desafiou o herói de Jules Verne e fez a volta ao mundo em menos de 80 dias. Os riscos não a impediam de continuar, nem os sacríficos pessoais :seus trabalhos foram múltiplos, ela denunciou as condições penosas do trabalho feminino, os assédios, os salários ínfimos, os alojamentos reduzidos e em mau estado, o desespero das mães trabalhadoras diante do destino que se anunciava a seus filhos, vidas destroçadas pelo desprezo e os maus tratos, diretamente derivados do fato de serem... Mulheres. Debruçou-se igualmente sobre o tratamento e a internação arbitrária de mulheres em manicômios, fazendo-se internar ela mesma, para ver de perto as condições de vida que lhes era imposta.

Palavras-chave: aventura, jornalista, volta ao mundo, trabalho, mulheres

Seu verdadeiro nome era Elizabeth Jane Cochran, nascida em 5 de maio de 1864.  O pseudônimo de Nellie Bly foi adotado sob a pressão de seus irmãos, pois, segundo o adágio popular, o nome de uma mulher não deve aparecer nos jornais senão em três ocasiões: ao nascer, ao se casar e ao morrer. Assim, uma jornalista na família? Vergonha! (Baker, 21)

Em sua época, ficou, sobretudo, conhecida por sua viagem em volta ao mundo, uma aposta que fez com o personagem de Jules Verne, Philéas Fogg em « A volta ao mundo em 80 dias,” publicado em 1873.

Venceu a aposta ? Sim. Sua viagem durou exatamente 71 dias, dos quais 15 foram paradas forçadas devido às contingências de horário e à frequência dos navios. No fim do século XIX era uma viagem muito complicada, pontuada por azares: os horários dos meios de transporte ( trem, navio), as intempéries, os atrasos, as escalas muito longas.

Numa quinta-feira, 14 de novembro, precisamente 9 :40h, Nellie Bly começa sua viagem. Financiada pelo New York World, jornal de Joseph Pulitzer ( criador do premio do mesmo nome) lançou-se sozinha em uma aventura, tornando-se a primeira pessoa a realizar esta façanha.

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A repercussão desta viagem assegurou-lhe a independência financeira e consolidou sua carreira jornalística. Voltarei a esta questão.

Mas seu caminhar era antes de tudo um combate feminista, pois suas reportagens se debruçavam, sobretudo, sobre o destino das mulheres em situações diversas, nas quais imergia antes de descrevê-las. Queria fazer parte do vivido das mulheres e foi assim que partilhou do trabalho das operárias ou das empregadas domésticas. Fingiu também ser louca para conhecer a situação das mulheres internadas em um asilo de alienadas, cujo relato aumentou-lhe o prestígio.

Os riscos não a detinham, nem os sacrifícios pessoais: denunciava as condições penosas de trabalho das mulheres, os ultrajes sofridos, os salários miseráveis, os alojamentos estreitos e em mau estado, o desespero das mães trabalhadores diante da situação de seus filhos, vidas quebradas pelo desprezo e pelo maltrato, diretamente derivados do fato que eram... mulheres.

Sua revolta contra um artigo sobre a inferioridade das mulheres valeu-lhe o primeiro emprego como jornalista. Escreveu uma carta ao jornal com tal entusiasmo, refutando todos os argumentos do artigo misógino, que o editor do Pittsburgh Dispatch, impressionado, engajou-a como jornalista.

Nellie Bly começou assim a escrever sobre a vida das operárias, mas insistiu em partilhar seus trabalhos antes de escrever: jornadas de trabalho exaustivas, a sujeira das habitações, os salários de fome. Suas reportagens causaram uma explosão na tiragem do Dispatch e receberam os aplausos da população, bem como a revolta dos chefes e proprietários das indústrias.  Suas reportagens expunham os fatos, o que permitia a seu público “ver” exatamente o que ela havia visto.

Nellie Bly queria abrir novos horizontes e conseguiu-o : financiada por seu jornal tornou-se correspondente no México: viajou durante seis meses por toda parte, com sua mãe como acompanhante, em lombo de jumento, quando não havia outra opção. Suas reportagens tiveram grande repercussão e como não tinha papas na língua sobre os fatos constatados, foi gentilmente convidada a deixar o país de Porfírio Diaz.

 

Mulheres jornalistas

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Era um fato excepcional, uma mulher jornalista em sua época? Com efeito, a névoa e o silêncio que acompanham a trajetória das mulheres no discurso histórico escondem a intensa atividade das mulheres no social.

Frances Backhouse, em seu excelente livro sobre as mulheres na corrida de ouro para o Klondike no fim do século XIX (Backhouse, 2000), expõe a existência de personagens apagados de uma história que relega as mulheres ao papel único de prostitutas nos grandes movimentos de população. [i]

Ora, elas foram numerosas a trabalhar na prospecção de ouro, foram proprietárias de minas, de hotéis, de lavanderias, de restaurantes, professoras, empregadas de banco ou da administração do governo, enfermeiras, médicas, missionárias, comerciantes, fotógrafas e jornalistas, etc. (Backhouse,2000 :140).

Na América do Norte e em outros países, portanto, Nellie Bly não era a única a se aventurar em territórios inexplorados, como correspondente de um jornal.

Helen Dare foi enviada ao Klondike pelo San Francisco Examiner. Ficou muito impressionada pelas más condições de vida em Dawson e escreveu:

« Gold is pretty and good to have, but one grows to hate its yellow sheen when one sees how it draws men on and pranks with them like a mocking devil » (Backhouse, 2000: 147)

Flora Shaw, jornalista inglesa foi também enviada ao Klondike e em várias regiões do império britânico, como a Austrália, enquanto correspondente do London Times. Em Dawson, inverte os papéis e emprega um homem para cozinhar, limpar e lavar suas roupas; partiu sozinha fazer suas entrevistas nas lavras, com os mineradores, após haver tentado com suas próprias mãos o rude trabalho de prospecção de ouro nos rios. (idem : 146) .

Frances Backhouse observa que:

«Another career which opened up to women in the late Victorian era was journalism. […] women were sent by several eminent newspapers, as well as a number of smaller publications, to cover the story. […] Instead of watching from the sidelines they helped make the news by participating in events.” (Backhouse, 2000:142)

Toronto Globe enviou Faith Fenton ao Klondike, que em sua trajetória já  havia sido editora chefe no The Canadian Home Journal, cujos artigos foram igualmente publicados no New York Sun e no Toronto Empire.

As mulheres jornalistas foram numerosas no século em questão, famoso por sua misoginia: basta quebrar o silencio que enclausura as mulheres na domesticidade, para encontra-las em toda parte, ativas.

A pesquisa feminista em histórica, neste sentido, descontrói o passado androcêntrico: as mulheres estiveram sempre presentes no social, apesar da invisibilização de suas ações, o que é demonstrado pelas mulheres de aventura. Se seus direitos eram limitados, perfuravam assim mesmo as barreiras e impunham sua presença ali  onde a história as ignora. A história feminista não se restringe à divisão “imutável” do trabalho ou aos incontornáveis papéis “generizados”. Revela o que a história não diz, mas que, entretanto, fazia parte intrínseca do social.

Quem acreditaria que nesta época existiam mulheres jornalistas, correspondentes de guerra, sozinhas em regiões longínquas, desafiando os perigos e os preconceitos, sem acompanhante e sem um homem para “protege-las”? Elas existiram de fato e seus exemplos encorajaram outras mulheres a exigir a igualdade de direitos e liberdade de ação.

As lutas pelos direitos civis, o direito ao trabalho, o direito de voto para as mulheres tiveram seu ponto alto nas últimas décadas do século XIX e início do século XX.[ii] E Nellie Bly teve uma grande participação neste movimentos enquanto feminista e repórter. Foi correspondente de guerra durante a primeira guerra mundial na frente oriental da Europa e foi mesmo presa pela polícia húngara sob suspeita de espionagem. (web)

Aliás, o papel das mulheres nas guerras é quase desconhecido, apesar de documentários ou certos filmes que mostram as mulheres partisans, em missão de espionagem, nas guerrilhas, correspondentes, etc, etc. [iii] Por que quase não se fala das mulheres na resistência francesa, italiana, mesmo alemã, que arriscaram suas vidas e foram torturadas, fuziladas? A quem interessa esconder a presença das mulheres em todos os acontecimentos aordados nos discursos da história? O patriarcado desvia o olhar delas e mostra apenas as imagens da “verdadeira mulher”, doméstica e domesticada.   

Segundo os livros de história ou a maioria da mídia, as mulheres teriam ficado sempre à sombra, soluçando de medo, tais como as pioneiras na conquista do oeste americano, que são invariavelmente mostradas sob as charretes, enquanto os índios atacam. Como se pode imaginar mulheres que migram em uma tal aventura e não seriam capazes de tomar as armas, de se defender e defender seus familiares? Calamity Jane ficou famosa por sua atuação na conquista do Oeste americano, como mulher que sabia manejar armas e não se conformava ao modelo feminino, frágil e desprotegido. [iv] Ela é apenas um exemplo  a quebrar o silencio da história. Porque seria ela a única neste contexto a destruir o modelo das mulheres incapazes ou outra opção, prostitutas? É o imaginário masculino que reproduz sem cessar estas figuras femininas incapazes, mas certamente improváveis, como o mostra o exemplo das mulheres de aventura.

São estas representações sociais que reinstauram as imagens de fraqueza e inércia das mulheres. Entretanto, as mulheres nos Gulags russos [v]  dos anos 1930/40 eram acusadas dos mesmos “crimes” que os homens, fazendo os mesmo trabalhos forçados, sofrendo as mesmas condições de vida, em temperaturas de -40 graus, famélicas e insuficientemente vestidos. Nestes casos, havia igualdade.

 

De volta a Nellie Bly. O asilo das loucas.

 

Além de jornalista, Nellie Bly foi uma das mulheres de negócios americana, dirigindo uma indústria onde havia tentado colocar em prática suas ideias sobre salários justos e condições de trabalho adequadas para suas operárias. E ainda encontrou tempo para inventar produtos, muitos dos quais foram patenteados. [web1]

Eclética, sem medo, mulher de convicções profundas, Nellie Bly aceitava e criava seus próprios desafios.

Sempre atenta aos direitos das mulheres, experimentou as condições de uma prisão feminina e esta experiência resultou em numerosos artigos sobre as condições de vida das prisioneiras. Seus escritos tiveram uma influencia maior, já que a vigilância sobre as prisioneiras passou sob a tutela de guardiãs, tirando as mulheres dos poderes e desejos masculinos.

Almejava apagar e deter as injustiças : denunciou a corrupção, o tratamento infligido aos pobres, motivando mudanças na administração da cidade de Nova Iorque. Seus textos faziam crescer as vendas do jornal e, sobretudo incitavam o público a exigir reformas. Nellie Bly tornou-se de fato a porta-voz das mulheres e dos pobres em geral. [web2]. Suas reportagens provocavam sempre conscientização e protestos e eram esperados com receio por alguns.

Seu internamento voluntário na ilha de Blacwell , onde se enclausuravam as mulheres consideradas loucas, foi uma de suas experiências mais conhecidas.

Com efeito, havia rumores a respeito dos maus tratos e das condições terríveis do internamento nesta instituição e o jornal New York World intentou pesquisar sobre isto. Nellie Bly recebeu então, como primeira reportagem para este jornal, a tarefa de se fazer passar por louca para constatar do interior mesmo do estabelecimento as condições de vida e os tratamentos pelos quais as internas passavam.

Duas questões cruciais se colocavam : 1- como agir para se fazer internar nas ilha de Blackwell ; 2- como de lá sair.

Quando perguntou ao editor do jornal como faria para tirá-la de lá, ele simplesmente respondeu: “não sei”. Mas assegurou-lhe:

"[…] we will get you out if we have to tell who you are, and for what purpose you feigned insanity–only get in."

Parece que isto foi suficiente para dar-lhe confiança.

Depois de conceber diversas situações, Nellie considerou que o melhor meio de ser admitida no asilo era passar por uma decisão judiciária. Antes de começar sua tarefa, pensou na eventualidade de realmente tornar-se louca, uma vez fechada no asilo com uma multidão de mulheres loucas. Mas em nenhum momento pensou em abandonar esta missão.

Como apresentar um aspecto de louca? Ela começou a treinar diante do espelho, com caretas e arregalando os olhos sem piscar. Era de fazer medo. Pensou assim ter a necessidade de aparentar loucura, mas os acontecimentos seguintes revelaram que isto era supérfluo.

Primeiro, decidiu  se mudar para um abrigo de trabalhadoras, a Temporary Home for Females,  No. 84, Segunda Avenida e lá, Nellie passou a agir de maneira estranha.

O local era triste, lúgubre. Havia muita gente, mas as trabalhadoras não voltavam senão à noite, para um magro jantar e uma noite sinistra em uma sala mal iluminada.

Nellie Bly descreve com detalhes as situações vividas e os lugares por onde passou, com humor e um senso crítico muito desenvolvido. Seu objetivo, aliás, era de:

« Write up things as you find them, good or bad; give praise or blame as you think best, and the truth all the time”[vi][6]

Para aperfeiçoar seu  papel, não dormiu a noite toda, o que lhe deu um ar desconectado. Falava apenas da perda de seus bens e mostrava não se lembrar de nada em relação aos últimos fatos de sua vida. Diante disto, as mulheres do local se mostraram hostis e debochadas, salvo Mrs. Ruth Caine, a única que se ocupou dela. Nada de ajuda ou compaixão, as mulheres entre elas pareciam não se importar umas com as outras. Triste experiência.

Nellie, com um ar bizarro, insistia dizendo que todas as mulheres na casa eram loucas. Conseguiu assim reações muito vivas. Nellie as descreve :

“They expressed themselves in various ways. "Poor loon!" they said. "Why, she's crazy enough!" "I am afraid to stay with such a crazy being in house." "She will murder us all before morning." One woman was for sending for a policeman to take me at once. They were all in a terrible and real state of fright.”

Logo foi levada diante de um juiz que  a enviou ao hospital Bellevue para ser examinada pelos médicos, tendo em vista sua amnésia. A recepção no hospital foi feita por homens brutos, sem consideração.

Nellie Bly conseguiu iniciar uma conversação com uma das pacientes durante a espera no hospital. Sua narrativa já começava a confirmar as suspeitas do editor de Nellie, que escreve:

«[… ] her name was Miss Anne Neville, and she had been sick from overwork. She had been working as a chambermaid, and when her health gave way she was sent to some Sisters' Home to be treated. Her nephew, who was a waiter, was out of work, and, being unable to pay her expenses at the Home, had had her transferred to Bellevue. “Is there anything wrong with you mentally as well?" I asked her. "No," she said. "The doctors have been asking me many curious questions and confusing me as much as possible, but I have nothing wrong with my brain."

Uma  vez decretada a loucura, não havia aparentemente nada mais a se fazer, os dados estavam lançados. Nellie Bly que queria a todo custo esclarecer os fatos, perguntou à paciente:

"Do you know that only insane people are sent to this pavilion?" I asked. "Yes, I know; but I am unable to do anything. The doctors refuse to listen to me, and it is useless to say anything to the nurses”

Nellie deveria em breve passar pela mesma situação: um médico a examina sumariamente, toma seu pulso, pergunta-lhe se ela era sustentada por homens e decreta :

"Positively demented," he said. "I consider it a hopeless case. She needs to be put where some one will take care of her."

Assim, os diagnósticos de demência eram completamente desprovidos de sentido e não seguiam nenhum método. Em seu caso, acrescentaram uma consideração de ordem moral ( sustentada ou não por homens); por outro lado, a outra mulher ia ser internada simplesmente por pobreza.

Uma terceira mulher, com quem havia falado foi internada por « doença nervosa » ; ora, ela estava simplesmente cansada ao extremo por um trabalho extenuante.
Houve ainda duas visitas médicas em Bellevue onde as questões foram idênticas para todas as mulheres: se ouviam vozes, o que diziam as vozes, se viam faces  na parede. Quanto a Nellie havia ainda dúvidas sobre sua moral, pois perguntaram-lhe se tinhas amantes ou se era ou havia sido casada. Sem mais, ouviu sua sentença: seu caso era sem esperança.

Este tipo de diagnóstico podia condenar uma mulher a ser internada pela vida toda em um asilo sem outra chance de provar sua saúde mental.

Uma vez estabelecido o diagnóstico o procedimento era rápido: as mulheres embarcavam para serem internadas na ilha Blackwell, sem apelo possível. Toda tentativa para escapar era reprimida com brutalidade. Mesmo se quisessem escapar, Nellie comenta com humor:

« The odor of the male attendant's breath was enough to make one's head swim.”

 

Quando o barco chega na ilha, Nellie pergunta aos guardas:

"What is this place?" I asked of the man, who had his fingers sunk into the flesh of my arm. "Blackwell's Island, an insane place, where you'll never get out of."

E ela constatará que não era dada nenhuma possibilidade às internas de provar sua boa saúde mental: falou com diversas mulheres e estes testemunhos mostraram o arbítrio das medidas de internamento

Encontrou em Blackwell uma alemã que não falava inglês e não sabia como nem porque se encontrava em tal legal.  

 “Compare this with a criminal, who is given every chance to prove his innocence”. escreve Nellie.

Por um frio intense, elas foram levadas a uma sala  gelada, vazia, com alguns bancos inconfortáveis, grades nas janelas e as deixaram esperando. Um médico finalmente chegou mas não se dignou falar às mulheres: começou a conversar uma enfermeira. Isto era a expertise.

Foram levadas em seguida para jantar, empurradas, surradas : ouvia-se de vez em quando um tapa ressoar ao longo do corredor gelado. Uma vez no refeitório, uma estreita e longa sala, as mulheres se jogavam nos lugares em volta da mesa para receber apenas chá, um pão e cinco ameixas. Esfomeadas, as internas roubam a comida umas às outras.

Nellie  não comeu nada. Deu tudo às outras; mesmo o chá era intragável.

“My bowl of tea was all that was left. I tasted, and one taste was enough. It had no sugar, and it tasted as if it had been made in copper. It was as weak as water.”

Após uma rápida passagem pelo sinistro salão, onde Nellie tentou tocar um pouco de piano, o banho! A água estava gelada e para acabar com seus protestos, jogaram-lhe três baldes de água gelada na cabeça.

[...]They put me, dripping wet, into a short canton flannel slip, labeled across the extreme end in large black letters, "Lunatic Asylum, B. I., H. 6." The letters meant Blackwell's Island, Hall 6.”

Por que estas mulheres eram tratadas desta maneira? Explicaram-lhe que quando se depende da assistência pública não há espaço para queixas.

Métodos brutais eram utilizados para controlar todas estas “loucas” que, de fato, em sua grande maioria eram culpadas de não serem mulheres dentro do modelo “normal”. Ou apenas por serem mulheres.

Entreato

A loucura é construída socialmente segundo as épocas e as injunções morais e religiosas, segundo normas sociais e comportamentos instituídos:  assim os diagnósticos eram lançados, um após outro, de acordo com os parâmetros de normalidade física, definidos para cada sexo. (Cunha,1989 :126)

A loucura feminina é desta forma uma condenação implacável para toda desobediência às regras, às condutas pré-fixadas, aos laços de submissão, à desrazão imposta, insubordinação de um corpo em “desordem” simbólica.

Camille Claudel (1864-1943) viveu os 30 últimos anos de sua vida internada em um asilo por seu próprio irmão. Diagnóstico: mania de perseguição e a-sociabilidade. De fato, ela se isolava de uma sociedade que recusava seu talento e seu gênio criador, coisa “ fora da natureza para uma mulher” segundo a expressão de Otávio Mirabeau diante de suas obra. (Cunha,1989 :113)

Ela havia recusado o modelo da « verdadeira mulher » e seu castigo veio “naturalmente”: aprisionamento perpétuo. Seu irmão, o super católico e “piedoso” Paul Claudel permaneceu surdo à todas suas súplicas para ser libertada.

Os diagnósticos dado às mulheres internadas no asilo do Juquery, em São Paulo, Brasil, confirmam perfeitamente a construção da loucura baseada em considerações sociais ou morais: desobediência ao pai, celibato, independência, sexualidade livre, inteligência excessiva, super excitação intelectual, desejo de ter uma carreira, orgulho desmesurado, iniciativas demais. Estas são as razões para o internamento das mulheres neste asilo no início do século XX, mesma época de Camille Claudel.[vii]

Maria Clementina da Cunha sublinha que para um homem todas estas características seriam consideradas positivas. (idem) Constata igualmente que um grande número de mulheres eram internadas por seus parentes próximos ( marido, filho, pai, etc) quando seus comportamentos eram considerados prejudiciais aos interesses masculinos da família.

Toda veleidade de liberdade, toda tentativa de escapar ao destino biológico, às tarefas habituais às mulheres, ao assujeitamento, podiam ser punidas com o internamento no asilo. Os homens da família internavam as mulheres sob os mais diversos pretextos, com a complacência dos médicos que diagnosticavam sua loucura, “ em todo caso”como detectou Cunha, em sua pesquisa.

Na época clássica, Foucault sublinha que:

« Débauche, prodigalité, liaison inavouable, mariage honteux comptent parmi les motifs les plus nombreux de l'internement. Ce pouvoir de répression qui n'est ni tout à fait de la justice ni exactement de la religion[...] ne représente pas au fond l'arbitraire du despotisme, mais le caractère désormais rigoureux des exigences familiales. L'internement a été mis par la monarchie absolue à la discrétion de la famille bourgeoise ». (Foucault, 2001 : 125)

Histéricas, nervosas, instáveis, alguns destes epítetos acompanham a vida de toda mulher: corpos perturbados pelos hormônios em ebulição, cuja única acalmia se encontrava na procriação. Entre norma e desrazão, as mulheres são identificadas por um sexo biológico, mas, sobretudo social e este julgamento atravessa os séculos. Segundo Foucault, nos séculos XVIIe e XVIIIe,

« L'asile réduira les différences, réprimera les vices, effacera les irrégularités. Il dénoncera tout ce qui s'oppose aux vertus essentielles de la société: le célibat, «le nombre des filles tombées dans l'idiotisme est 7 fois plus grand que le nombre des femmes mariées[...]; pour la démence, la proportion est de deux à quatre fois; on peut donc présumer que le mariage pour les femmes est une sorte de préservatif contre les deux espèces d'aliénation les plus invétérées et le plus souvent incurables » (Foucault, 2001 : 612)

Extravagantes, elas serão punidas pelo ostracismo, pelos olhares reprovadores, pois somente monstros negariam sua « natureza » primeva. Ou então, são apenas velhas, fora do mercado do casamento, inúteis, portanto, e assim são descartadas para melhor serem esquecidas. Quer seja hoje nas casas para idosos ou nos hospitais ou então em 1690, como indica Foucault,

« . [...] 20 «femmes caduques» à Saint-Paul; le quartier de la Madeleine contient 91 «vieilles femmes en enfance ou infirmes»; celui de Sainte-Geneviève 80 «vieilles femmes fileuses»,[...]; à Saint-Hilaire, on a mis 80 femmes en enfance, à Sainte-Catherine 69 «innocentes mal taillées et contrefaites» ; les folles sont réparties entre Sainte-Elizabeth, Sainte-Jeanne et les cachots, selon qu'elles ont seulement ‘ l'esprit faible’, que leur folie se manifeste par intervalles, ou que ce sont des folles violentes. Enfin, 22 ‘filles incorrigibles’ ont été mises, pour cette raison même, à la Correction » (Foucault, 2001 :113-114)

A desrazão se alia ao pecado e à imoralidade para designar uma “natureza” desregrada. Internadas como velhas loucas, queimadas como feiticeiras, o Ocidente traça um retrato das mulheres que se incrustou e reaparece enquanto acontecimentos em práticas discursivas em diferentes momentos da história.

São enclausuradas em uma representação social cujos muros e grilhões são tão espessos quanto os de uma prisão ou asilo.

No coração da ilha Blackwell

Uma enfermeira as intimida desde a entrada :

 "Well, you don't need to expect any kindness here, for you won't get it," she said, and she went out and closed the door”

Depois do banho frio, sem dispor de toalhas para se enxugar, as mulheres são conduzidas, ainda todas molhadas, até camas desconjuntadas que tornavam o sono impossível, ainda mais por causa das enfermeiras que entravam e saiam a todo momento, batiam as portas e falavam alto entre elas.

Pela manhã, Nellie foi empurrada fora da cama e deram-lhe roupas desencontradas, grotescas. Havia lá 45 mulheres que para se lavar utilizavam a mesma água e a mesma toalha e todas deviam se pentear com 6 pentes. Nellie nota que muitas entre elas tinham problemas de pele e cabelos duvidosos: tudo podia se transmitir neste tipo de economia.

Um café da manhã intragável e algumas pacientes estavam então prontas para os trabalhos do dia de limpeza, lavagem de roupa e todos os cuidados com o estabelecimento.

As outras ficavam sentadas em bancos sem fazer nada, em silencio. Uma vez por semana era levadas para um pequeno passeio e encontravam outras mulheres, numerosas, vestidas de farrapos.

“We had not gone many paces when I saw, proceeding from every walk, long lines of women guarded by nurses. How many there were! Every way I looked I could see them in the queer dresses, comical straw hats and shawls, marching slowly around.”

Outras pareciam saídas de um pesadelo. Nellie narra:

“They are considered the most violent on the island" […] They are from the Lodge, the first building with the high steps. Some were yelling, some were cursing, others were singing or praying or preaching, as the fancy struck them, and they made up the most miserable collection of humanity I had ever seen.[…] A long cable rope fastened to wide leather belts, and these belts locked around the waists of fifty-two women. […] Crippled, blind, old, young, homely, and pretty; one senseless mass of humanity. No fate could be worse.”

Cerca de 1.600 mulheres estavam internadas em Blackwell. Maltratadas, esfomeadas, desprezadas; obrigadas a fazer trabalhos penosos ou enfrentar longos períodos de imobilidade e silencio... quantas dentre elas sofriam realmente de um problema psíquico? perguntava-se Nellie Bly. E a demência  justificaria um tal tratamento? Quantas dentre elas não se tornaram loucas em tais condições de desespero e abandono?

« What, excepting torture, would produce insanity quicker than this treatment? Here is a class of women sent to be cured. I would like the expert physicians who are condemning me for my action, which has proven their ability, to take a perfectly sane and healthy woman, shut her up and make her sit from 6 A. M. until 8 P.M. on straight-back benches, do not allow her to talk or move during these hours, give her no reading and let her know nothing of the world or its doings, give her bad food and harsh treatment, and see how long it will take to make her insane. Two months would make her a mental and physical wreck.”

A partir desta visão, ela toma uma decisão :

“I would try by every means to make my mission of benefit to my suffering sisters”

 À noite, ouviam-se gritos de socorro, apelos à polícia; a comida era intragável e o odor da boa alimentação para os médicos e enfermeiras atravessava os corredores, mais uma forma de tortura. As velhas, as aleijadas, as abandonadas eram destinadas ao asilo já que sua utilidade como mulher não existia mais. Nellie Bly narra esta cena vivida por uma velha mulher, que lembra as análises feitas por Foucault:

« She appeared easily seventy years old, and she was blind. Although the halls were freezing-cold, that old woman had no more clothing on than the rest of us, which I have described. When she was brought into the sitting-room and placed on the hard bench, she cried: "Oh, what are you doing with me? I am cold, so cold. Why can't I stay in bed or have a shawl?"

Ela tinha sapatos que a feriam e as enfermeiras a forçavam a usá-los, obrigavam-na a sentar no frio, quando ela pedia para deitar. A crueldade modelava o rosto das enfermeiras em rictos malévolos.

“At this I saw Miss Grupe sit down on her and run her cold hands over the old woman's face and down inside the neck of her dress. At the old woman's cries she laughed savagely, as did the other nurses, and repeated her cruel action. That day the old woman was carried away to another ward. “

Mulheres em perigo

Abusadas por uma violência doméstica e social, material e simbólica, curvadas por um trabalho repetitivo e numerosos partos, confrontadas a um futuro sem saída, as mulheres “do lar” eram muitas vezes internadas em asilos quando deixavam explodir sua cólera contida, ou recusam a submissão e a dependência.

As que trabalhavam fora de casa e tinham outros horizontes não eram e não o são hoje, liberadas das responsabilidades domésticas ( dupla e tripla jornada de trabalho). Todas partilham os epítetos “loucas”, “histéricas” quando reivindicam a repartição do trabalho, o respeito por seu corpo e sua integridade.Ou quando tomavam a palavra.

A histerização dos corpos das mulheres se apresenta assim como uma manifestação palpável da loucura feminina, em uma certa economia discursiva, pois sua “natureza” seria causa e lócus do caos. O corpo masculino, por outro lado, seria mais resistente à expressão da loucura.

Foucault comenta os discursos da medicina do século XVIII sobre a histeria, doença feminina:

« Plus l'espace intérieur est aisément pénétrable, plus fréquente sera l'hystérie et multiples ses aspects; mais si le corps est ferme et résistant, si l'espace intérieur est dense, organisé et solidement hétérogène en ses différentes régions, les symptômes de l'hystérie sont rares et ses effets demeureront simples. N'est-ce pas cela justement qui sépare l'hystérie féminine de la masculine, ou, si l'on veut, l'hystérie de l'hypochondrie.[...] cette densité spatiale livre un de ses sens; c'est qu'elle est aussi densité morale; la résistance des organes à la pénétration désordonnée des esprits ne fait peut-être qu'une seule et même chose avec cette force de l'âme qui fait régner l'ordre dans les pensées et dans les désirs». (Foucault, 2001 :364-365)

Nellie Bly recolhe inúmeros testemunhos que confirmam suas suspeitas: as mulheres internadas no asilo, à parte um número ínfimo, não eram absolutamente loucas, na época de seu internamento. Em seguida, talvez tenham se tornado insanas, tendo em vista as condições de vida a que eram submetidas.

Nellie apresenta alguns casos:

1. “A nice-looking German girl–quite young, she seemed, and when she came in all the patients spoke of her nice appearance and apparent sanity. Her name was Margaret. She told me she had been a cook, and was extremely neat. One day, after she had scrubbed the kitchen floor, the chambermaids came down and deliberately soiled it. Her temper was aroused and she began to quarrel with them; an officer was called and she was taken to an asylum.”

2.” "Why did you come here?" I asked her one day, after we had indulged in a long conversation. "I was sick," she replied. "Are you sick mentally?" I urged. "Oh, no; what gave you such an idea? I had been overworking myself, and I broke down. Having some family trouble, and being penniless and nowhere to go, I applied to the commissioners to be sent to the poorhouse until I would be able to go to work." […]Don't you know there are only insane women, or those supposed to be so, sent here?" I knew after I got here that the majority of these women were insane, but then I believed them when they told me this was the place they sent all the poor who applied for aid as I had done."

3.”A pretty young Hebrew woman spoke so little English I could not get her story except as told by the nurses. They said her name is Sarah Fishbaum, and that her husband put her in the asylum because she had a fondness for other men than himself”

Os tratamentos eram confiados a enfermeiras que tinham o hábito de maltratar estas pobres mulheres: golpes, banhos gelados, espancamentos, privação de água, doses elevadas de medicamentos que as tornavam amorfas ou muito agitadas. Toda revolta era punida pela transferência ao pavilhão da “perigosas”; é assim que testemunhas duas das pacientes contatadas pro Nellie:

1. « After breaking a window I was transferred to the Lodge, the worst place on the island. It is dreadfully dirty in there, and the stench is awful. In the summer the flies swarm the place. The food is worse than we get in other wards and we are given only tin plates. Instead of the bars being on the outside, as in this ward, they are on the inside. There are many quiet patients there who have been there for years, but the nurses keep them to do the work. Among other beating I got there, the nurses jumped on me once and broke two of my ribs”

2. “I made the acquaintance of Bridget McGuinness, who seems to be sane at the present time. She said she was sent to Retreat 4, and put on the "rope gang." "The beating I got there were something dreadful. I was pulled around by the hair, held under the water until I strangled, and I was choked and kicked.”

Nellie tentou várias vezes se queixar aos médicos (16 para 1600 pacientes) mas eles sequer a escutaram. Insistiu e perguntou-lhes como podiam fazer um diagnóstico  contentando-se de dizer “bom dia” e não escutavam nenhuma das mulheres?

Nellie Bly afirma :

« I always made a point of telling the doctors I was sane and asking to be released, but the more I endeavored to assure them of my sanity the more they doubted it. “

Os maus tratos podiam levar à morte:

"While I was there a pretty young girl was brought in. She had been sick, and she fought against being put in that dirty place. One night the nurses took her and, after beating her, they held her naked in a cold bath, then they threw her on her bed. When morning came the girl was dead. The doctors said she died of convulsions, and that was all that was done about it. […]”

De fato, tudo se passava como se a instituição abrigasse a loucura ela mesma. Uma vez internada, toda mulher tornar-se-ia louca. Assim, quando se está em Blacwell, automaticamente se é louca. É, portanto o local que define a loucura.

Estes tipos de maus tratos eram infligidos às pessoas internadas em asilo. O extremo limite foram os campos de concentração, quer sejam nazistas ou soviéticos, cubanos, norte coreanos e tantos outros. A partir deste grau zero da maldade humana, os asilos, hospitais, prisões, ditaduras morais, religiosas, políticas, permitem todas as possibilidade de abuso, pois nestas instituições o que reina é o exercício do poder sem limites. Sobretudo sobre as mulheres, que além de todas as violências sofrem abusos sexuais de toda ordem.

Após partilhar por dez dias os horrores das mulheres internadas e assim, tratadas como insanas, um advogado veio buscar Nellie Bly sob pretexto que amigos queriam cuidar dela. Deixa assim a ilha de Blacwell.

Nellie escreveu um livro e muitos artigos sobre esta estadia o que levou à instalação de um inquérito judicial sobre os procedimentos constatados por ela em Blackwell.

Entretanto, o furacão levantado pelo inquérito judicial em Blackwell  teve como consequência o desaparecimento misterioso das mulheres cujo testemunho Nellie havia coletado. Os médicos, por sua vez, afirmaram que eles não sabiam de nada. Mas o testemunho de Nellie foi decisivo, pois ela quebrou o silencio que negava o desamparo das mulheres “enterradas” no asilo psiquiátrico.

Assim, muitas transformações ocorreram em Blackwell. Mas uma vez passadas as mudanças exigidas pelas denúncias e pela indignação da opinião pública, o que aconteceu com estas mulheres, destinadas ao esquecimento?

Em todo caso, Nellie Bly conseguiu alcançar seu objetivo: mostrar a fabricação social da loucura e as horrendas condições de vida impostas àquelas que não se encaixavam no modelo de mulher-esposa-mãe.

A volta ao mundo

Nellie Bly foi a primeira pessoa ( não a primeira mulher) que realizou a volta ao mundo em tão pouco tempo.

O livro de Jules Verne “ A volta ao mundo em 80 dias” , cujo personagem principal era Philéas Fogg, foi publicado em 1873. Sempre em busca de desafios, Nellie Bly propôs ao editor do NY World uma aposta: ela faria a volta ao mundo em menos de 80 dias!

A ideia ficou em suspenso durante um ano; Nellie tomou conhecimento então, que o jornal pretendia enviar um homem em seu lugar. Seu diálogo com o editor foi o seguinte:

“It is impossible for you to do it," was the terrible verdict. "In the first place you are a woman and would need a protector, and even if it were possible for you to travel alone you would need to carry so much baggage that it would detain you in making rapid changes. Besides you speak nothing but English, so there is no use talking about it; no one but a man can do this." "Very well," I said angrily, "Start the man, and I'll start the same day for some other newspaper and beat him."

Ela já possuía um renome como jornalista. O editor a conhecia bem; sua energia, suas capacidades, sua obstinação a levar até o fim seus desafios. Preferiu então confiar-lhe esta aventura em lugar de perdê-la para um concorrente.

Assim, convocou-a e anunciou-lhe que o início da viagem estava previsto dentro de dois dias. O que em si já era um desafio para tudo preparar: documentos, cartas de apresentação, malas...

Nellie gostava de enumerar todos os detalhes: podemos acompanha-la quando manda fazer sua famosa roupa, com a qual aparece em todas as fotos: um casaco quadriculado, uma pequena valise de mão, algumas coisas de primeira necessidade e pronto. Nellye Bly estava pronta para a conquista do mundo. Pode-se com certeza aprender com ela como viajar de forma “light”.

 

“[…]I was able to pack two traveling caps, three veils, a pair of slippers, a complete outfit of toilet articles, ink-stand, pens, pencils, and copy-paper, pins, needles and thread, a dressing gown, a tennis blazer, a small flask and a drinking cup, several complete changes of underwear, a liberal supply of handkerchiefs and fresh ruchings and most bulky and uncompromising of all, a jar of cold cream to keep my face from chapping in the varied climates I should encounter.”

Recebeu um passaporte especial, n. 27, assinado por James G. Blaine, Secretário de Estado. Quanto ao dinheiro, o jornal lhe deu 200 libras em ouro e notas do Banco da Inglaterra. Ela explica como levaria o dinheiro:

“The gold I carried in my pocket. The Bank of England notes were placed in a chamois-skin bag which I tied around my neck. Besides this I took some American gold and paper money to use at different ports as a test to see if American money was known outside of America.”

Esta soma permitiu-lhe viajar confortavelmente, sempre em primeira classe.

Nellie Bly era uma jornalista ávida de conhecimentos e informações e também uma turista atenta: tudo a interessava, as paisagens, as pessoas, os costumes, a comida, os meios de transporte, seus e suas companheiros/ as de viagem.

Sempre havia de cavalheiros dispostos a ajuda-la, às vezes até demais e facilmente fez amizade com vários companheiros de viagem, homens e mulheres, com quem excursionou nos lugares em que seus navios aportavam.

Para uma jovem americana que não havia nunca empreendido grandes viagens, a volta ao mundo era não somente um desafio pessoal e simbólico para todas as mulheres, mas igualmente a ocasião de testar sua perseverança, suas forças, de enfrentar seus medos, suas hesitações, o enjoo no mar, suas angústias com os atrasos em seu programa, as escalas longas demais que poderiam fazê-la perder suas conexões.

Não era a única mulher a viajar sozinha:

« One bright, clever, American-born girl was traveling alone to Germany, to her parents. […] I have rarely, if ever, met her equal. In German as well as English, she could ably discuss anything from fashions to politics. Her father and her uncle are men well-known in public affairs, and by this girl's conversation it was easy to see that she was a father's favorite child; she was so broad and brilliant and womanly. There was not one man on board who knew more about politics, art, literature or music, than this girl […].”

A imagem das mulheres ignorantes e tímidas se encontra bem esgarçada diante destas duas viajantes!

A legislação de muitos países tomou como pretexto os discursos sobre a incapacidade, a fraqueza mental e física das mulheres para destituí-las de seus direitos de cidadania. A memória social registrou esta representação sobre um fundo de narrativas históricas, onde as mulheres sequer aparecem relegadas aos papéis subalternos/ subordinados.

Entretanto, a história feminista mostra que a criação das imagens negativas do feminino não serve senão a embasar o poder do patriarcado: este sistema impede as mulheres de agir e propaga em seguida a ideia que elas são incapazes de toda iniciativa. São reduzidas à domesticidade e atribui-se esta clausura  à sua “natureza”.

Tudo se passa, na ordem do discurso patriarcal, como se todas as mulheres fizessem parte de um mesmo grupo subordinado por sua inferioridade: a mulher ! É neste ponto que reside o interesse de manter esta denominação no singular.

Todavia, em sua diversidade, as mulheres atravessam este molde linguístico  / social sem se deixar prender. Tais como as mulheres de aventura. Tais como as mulheres que sempre trabalharam em todos os setores e deles foram apagadas nas estatísticas e na ordem do discurso científico /representacional.

A transversalidade, isto é, o gênero atravessado pelas condições raciais ou de classe faz explodir a ideia deste grupo considerado homogêneo: “ a mulher”, da qual se presume uma inferioridade “natural”.

Nellie, que desprezava o discurso da « mulher frágil”,  faz um balanço de seu percurso, que realizou sozinha, vencendo todos os obstáculos oriundos do fato de ser mulher:

“On my tour I traversed the following waters: North River, New York Bay, Atlantic Ocean, English Channel, Adriatic Sea, Ionian Sea, Mediterranean Sea, Suez Canal, Gulf of Suez, Red Sea, Straits of Bab el Mandeb, Gulf of Aden, Arabian Sea, Indian Ocean, Straits of Malacca, China Sea, Pacific Ocean, San Francisco Bay.”

“I visited or passed through the following countries: England, France, Italy, Egypt, Japan, the United States, and the following British possessions: Aden, Arabia; Colombo, Isle of Ceylon; Penang, Prince of Wales Island; Singapore, Malay Peninsula; and the Island of Hong Kong.”

Minuciosa, ela traça um quadro para ilustrar seu percurso:

quadro

Nov. 14–Leave New York by Augusta Victoria, 9.30 a.m.

" 21–Due Southampton. London by rail in three hours.

" 22–Leave Victoria Station, London, 8 p.m., on India Mail

" 23–Calais, Paris and Turin

" 24–Brindisi at 10.14 p.m.

" 25–Leave Brindisi, steamship Cathay, 9 a.m.

" 27–Ismallia.

 

Dec. 3–Aden.

" 10–Colombo (Ceylon).

" 16–Penang.

" 18–Singapore.

" 25–Hong Kong.

" 28–Leave Hong Kong for Yokohama, Japan.

Jan. 7–Leave Yokohama, via Pacific Mail Steamship.

" 22–Due San Francisco.

 

" 27–Due New York.

Nov. 14 to Jan. 27–seventy-five days.

Nov. 14–Left New York via Augusta Victoria.

 

" 22–2.30 a.m. Arrived Southhampton-London
" 22–10.00 a.m. Left London, Charring Cross Station

" 23–1.30 a.m. Left Calais

 

" 25–1.30 a.m. Arrived Brindisi.
3.00 a.m. Left Brindisi, steamship Victoria

" 27–3.30 p.m. Arrived Port Said.

" 28–11.00 a.m. Arrived Ismallia, 9.00 p.m. Suez.

Dec. 3–11.00 Arrived Aden.

" 8–11.00 a.m. Arrived Colombo (Ceylon).

" 16–7.00 a.m. Arrived Penang.

" 18–5.00 a.m. Arrived Singapore.

" 25–7.00 a.m. Arrived Hong Kong.

" 28–2.30 p.m. Left Hong Kong for Yokohama.

Jan. 7–10.55 a.m. Left Yokohama via Occidental and Oriental Steamship.

" 21–8.00 a.m. Arrived San Francisco

" 23–7.05 a.m. Arrived Chicago.

" 25–3.51 p.m. Arrived New York.

Nov. 14 to Jan. 25–Seventy-two days.

 

Miles

Hours Traveling

Hours Delayed

Hoboken to Southampton

3,041

184 50

50

To London

90

2 15

14 25 *

" Brindisi

1,450

53 30

1 30

" Port Said

930

62 30

3 30

" Aden

1,394

110

6

" Colombo

2,093

138

98 05

" Penang

1,278

89 55

7

" Singapore

381

39

11

" Hong Kong

1,437

111

127 20

" Yokohama

1,597

131 40

104 55

" San Francisco

4,525

333 05

 

" Chicago

2,573

71 05

2 55

" Jersey City

951

29 51

 
 

21,740

1356 41

377 30

Total time occupied in tour, 1,734 hours and 11 minutes, being 72 days, 6 hours and 11 minutes. 56 days 12 hours and 41 minutes in actual travel and lost by delay 15 days 17 hours and 30 minutes

Encantada pela oportunidade de conhecer o mundo, informa seu público sobre os prazeres e os aborrecimentos de viagem. Conta em detalhes seus trajetos em trem, de barco, assim como a qualidade da alimentação, das instalações, o tratamento recebido das tripulações, segundo a companhia e a nacionalidade das embarcações. Pequeno guia de viagem para os mais afoitos.

De Londres passou pela França e tomou o trem para Amiens, pois queria encontrar Jules Verne, o autor da Viagem em volta da terra em 80 dias, o instigador involuntário de seu périplo e que havia expressado o desejo de conhecê-la. Encontraram-se rapidamente, já que ela tinha uma conexão  em Paris. Achou-o encantador, assim como sua mulher:

“He sat forward on the edge of his chair, his snow-white hair rather long and heavy, was standing up in artistic disorder; his full beard, rivaling his hair in snowiness, hid the lower part of his face and the brilliancy of his bright eyes that were overshadowed with heavy white brows, and the rapidity of his speech and the quick movements of his firm white hands all bespoke energy–life–with enthusiasm.”

Nellie descreve seu encontro, sua casa, mas sua conversação foi muito limitada pelo desconhecimento recíproco da língua um do outro. Foi entretanto, um momento de grande satisfação para Nellie, encantada sobretudo por Mme Verne :

“She was the most charming figure in that group around the wood fire. Imagine a youthful face with a spotless complexion, crowned with the whitest hair, dressed in smooth, soft folds on the top of a dainty head that is most beautifully poised on a pair of plump shoulders. Add to this face pretty red lips, that opened disclose a row of lovely teeth, and large, bewitching black eyes, and you have but a faint picture of the beauty of Mme. Verne.”

O tempo pressionando, Jules Verne desejou-lhe boa viagem e boa sorte enquanto Mme Verne beijou-a em despedida.

“I gave her my hand and inclined my head, for I am taller than she, and she kissed me gently and affectionately on either check. Then she put up her pretty face for me to kiss. I stifled a strong inclination to kiss her on the lips, they were so sweet and red, and show her how we do it in America. My mischievousness often plays havoc with my dignity, but for once I was able to restrain myself, and kissed her softly after her own fashion.”

Durante sua viagem Nellie Bly encontra muitas mulheres, algumas das quais viajando sós.

 “The passengers formed two striking contrasts. There were some of the most fined and lovely people on board, and there were some of the most ill-bred and uncouth. Most of the women, whose acquaintance I formed, were very desirous of knowing all about American women, and frequently expressed their admiration for the free American woman, many going so far as to envy me, while admiring my unfettered happiness. Two clever Scotch women I met were traveling around the world, but are taking two years at it. One Irishwoman, with a laugh that rivaled her face in sweetness, was traveling alone to Australia.”

Isto vem confirmar minha hipótese que as mulheres estavam longe de se curvar aos modelos impostos de domesticidade, apesar dos obstáculos que as legislações misóginas podiam criar.Porém, grande número de pesquisadoras feministas contentam-se com o molde “universal” e não buscam além das narrativas de uma história androcêntrica, veiculada sempre sob a forma binária e hierárquica, do masculino imperando sobre o feminino.

Uma rápida busca bibliográfica mostra centenas de nomes de mulheres que viajaram e produziram conhecimento em biologia, entomologia, arqueologia, antropologia, geografia, glaciologia, economia, em momentos diferentes da história humana.

As mulheres de aventura não são exceção à regra da “mulher” subordinada e passiva:  elas mostram que a instituição deste modele não era nem universal nem tão vigorosa que nos querem fazer crer. É a razão pela qual, aliás, os discursos sobre a incompetência das mulheres é repetido sem cessar, para melhor assegurar sua impregnação no imaginário social.

Menos se fala das mulheres, menos se mostra  suas criações , melhor se ancora o mito da « superioridade masculina ». Quanto mais se recita o binário, mais se criam as fundações “naturais” do patriarcado.

Estas mulheres de aventura, em tempos e espaços distintos deixaram suas marcas sobre a ciência, percorreram o mundo e traçaram caminhos. Aquelas que escreveram nos legaram suas impressões e descobertas; pode-se facilmente imaginar o número de todas as que não deixaram traços, pois suas marcas e experiências foram perdidas e apagadas na massa das representações sociais de um feminino passivo e incompetente.

Nellie esboça descrições realistas das paradas nos portos, entre os quais Port Saïd, situado na entrada do Canal de Suez :

« Hardly had the anchor dropped that the ship was surrounded with a fleet of small boats, steered by half-clad Arabs, fighting, grabbing, pulling, yelling in their mad haste to be first. I never in my life saw such an exhibition of hungry greed for the few pence they expected to earn by taking the passengers ashore”

Espantou-se diante de uma miséria extrema, da presença de mendigos exibindo suas deformidades ou ferida para incitar a piedade.

Nellie Bly esteve atenta à sorte reservada às mulheres nos numerosos países que atravessou: relata a existência de uma orquestra unicamente formada por mulheres em Port Said. As mulheres não estavam enclausuradas como se acreditava. Vê igualmente mulheres e homens ao longo do canal que puxavam camelos carregados de pedras destinadas a reforçar as bordas do Canal.

“While standing looking after a train of camels that had just come in loaded with firewood I saw some Egyptian women. They were small in stature and shapelessly clad in black. Over their faces, beginning just below the eyes, they wore black veils that fell almost to their knees”

Uma vez em Aden, porto de saída do Canal de Suez, Nellie notou a beleza e a dignidade das mulheres, que mesmo em sua grande pobreza, enfeitavam-se de bijuterias:

« A number of women I noticed, who walked proudly along, their brown, bare feet stepping lightly on the smooth road. They had long purple-black hair, which was always adorned with a long, stiff feather, dyed of brilliant red, green, purple, and like striking shades. […] Many of the women, who seemed very poor indeed, were lavishly dressed in jewelry. They did not wear much else, it is true, but in a place as hot as Aden, jewelry must be as much as anyone would care to wear. […]On their bare, perfectly modeled arms were heavy bracelets, around the wrist and muscle, most times joined by chains”.

Havia coisas que a intrigavam, outras que a divertiam ou maravilhavam, tal como o menino que sobe com os passageiros no navio e mergulha perigosamente da ponte, para aparecer em seguida todo contente, para grande alívio dos expectadores.

Ao chegar em Colombo, encontrou-se em um paraíso verde, depois do incomodo calor que sofreram os passageiros do Vitoria durante a travessia do canal. E as joias! A beleza das peças de prata a maravilhavam! Diverte-se com o uso que fazem os nativos das peças de ouro americanas de 20 dólares : levavam-nas com uma corrente no pescoço.

Gourmet, Nellie regala-se com o curry e os pratos “quentes”; vai ao teatro e descobre o transporte em rickshaw, observa fascinada os encantadores de serpente e partilha com seus leitores/as suas impressões e seu prazer. Que belo país!

Para continuar sua viagem, Nellie Bly toma  outro navio, o Oriental, com o qual ficou encantada, comparado ao Vitoria. Há uma escala em Penang, na Malásia onde ela visita templos, lojas, observa os habitantes e comunica suas descobertas. Entretanto, o calor, a monotonia no navio faziam que até desejasse uma visita de piratas, o que era no mínimo inconsequente!

“It was sultry and foggy and so damp that everything rusted, even the keys in one's pockets, and the mirrors were so sweaty that they ceased to reflect. The second day out from Penang we passed beautiful green islands. There were many stories told about the straits being once infested with pirates, and I regretted to hear that they had ceased to exist, I so longed for some new experience”

As coisas que nos são conhecidas de sobejo hoje eram para ela e seu público grandes novidades:

« The people here, as at other ports where I stopped, constantly chew betel nut, and when they laugh one would suppose they had been drinking blood. The betel nut stains their teeth and mouthfuls blood-red. Many of the natives also fancy tinting their finger-nails with it.”

Em Singapura, ficou indignada quando um sacerdote hinduísta interditou-lhe a entrada no templo :

“My comrades were told that removing their shoes would give them admission but I should be denied that privilege because I was a woman. "Why?" I demanded, curious to know why my sex in heathen lands should exclude me from a temple, as in America it confines me to the side entrances of hotels and other strange and incommodious things. "No, Señora, no mudder," the priest said with a positive shake of the head. "I'm not a mother!" I cried so indignantly that my companions burst into laughter, which I joined after a while, but my denials had no effect on the priest. He would not allow me to enter.”

Mas por que afinal se espantava ela ? Todas as religiões monoteístas discriminam as mulheres e aparentemente o hinduísmo também. Existem templos budistas igualmente que não permitem a entrada de mulheres!

E ela, que havia se recusado a comprar qualquer coisa ( ofereceram-lhe até a compra de uma menina) não pode se conter e adquiriu um macaquinho que a acompanhará todo o restante de sua viagem:

 “At the door of their home was a monkey. I did resist the temptation to buy a boy at Port Said and also smothered the desire to buy a Singalese girl at Colombo, but when I saw the monkey my will-power melted and I began straightway to bargain for it. I got it. »

Passados 39 dias depois de deixar NY, Nellie chega a Hong Kong, a China britânica, à época. Precipita-se aos escritórios da Oriental and Occidental Steamship Company , ansiosa para saber quando poderia partir para o Japão. Ficou então estupefata com a notícia de que outra mulher estava fazendo igualmente a volta ao mundo e que trabalhava para o mesmo jornal.

Sua supressa foi imensa, pois isto nunca havia sido aventado. Mas, com efeito, ELIZABETH BISLAND havia partido de NY quase ao mesmo tempo que ela para fazer a volta ao mundo.[viii]

 Nellie havia deixado bem claro que uma competição não a interessava

"I promised my editor that I would go around the world in seventy-five days, and if I accomplish that I shall be satisfied," I stiffly explained. I am not racing with anyone. I would not race. If someone else wants to do the trip in less time, that is their concern. If they take it upon themselves to race against me, it is their lookout that they succeed.”

Mas de fato Nellie chega antes de Elizabeth, e é recebida como uma heroína.

Em Hong Kong sua fama havia chegado bem antes dela e todos queriam ajuda-la, hospedá-la, convidá-la para festas e eventos; conheceu a vida dos ingleses na ilha, as diversões, o teatro, as corridas de cavalo, muito apreciadas. Levaram-na a visitar a ilha e ela teve a ocasião de averiguar a pobreza na qual viviam os chineses.

 “It is said that over 100,000 people live within a certain district in Hong Kong not exceeding one-half square mile, and they furthermore positively affirm, that sixteen hundred people live in the space of an acre. This is a sample of the manner in which the Chinese huddle together. They remind me of a crowd of ants on a lump of sugar”

Ela descreve assim as duas faces da colônia inglesa, os costumes, a alimentação, o comércio, a língua utilizada, as paisagens, tudo servindo para maravilhar seu público com o exotismo do lugar.

Seu navio, partindo de Hong Kong aporta em Cantão e os chineses que sobem no navio parecem-lhe muito diferentes:

« They were gambling, smoking opium, sleeping, cooking, eating, reading and talking, all huddled together on one deck, which was in one large room, not divided into cabins. They carry their own beds, a bit of matting, and their own food, little else than rice and tea.”

Passeando em terra, Nellie Bly vê no caminho grandes manchas vermelhas no chão e explicam-lhe que é o sangue resultante das execuções, que se realizavam quase todos os dias naquele lugar. Os homens eram decapitados e as mulheres pregadas na madeira e em seguida cortadas em pequenos pedaços. O costume indicava que se um homem rico era condenado, podia comprar um substituto para morrer em seu lugar. No tribunal ela encontrou juízes jogando, apostando e fumando ópio. Pode-se imaginar a justiça chinesa....

No Japão, Nellie encantou-se com a limpeza, a comida excelente e os serviços. Pela primeira vez ela faz comparações e suas observações são implacáveis:

 “The Japanese are the direct opposite to the Chinese. The Japanese are the cleanliest people on earth, the Chinese are the filthiest; the Japanese are always happy and cheerful, the Chinese are always grumpy and morose; the Japanese are the most graceful of people, the Chinese the most awkward; the Japanese have few vices, the Chinese have all the vices in the world; in short, the Japanese are the most delightful of people, the Chinese the most disagreeable”.

Após um espetáculo, as dançarinas vieram vê-la:

« After the dance the geisha girls made friends with me, examining, with surprised delight, my dress, my bracelets, my rings, my boots–to them the most wonderful and extraordinary things,–my hair, my gloves, indeed they missed very little, and they approved of all. They said I was very sweet, and urged me to come again, and in honor of the custom of my land–the Japanese never kiss–they pressed their soft, pouting lips to mine in parting.”

A viagem de volta aos Estados Unidos não foi fácil, marcado por correntes contrárias e tempestades. Nellie temia nunca chegar a tempo para ganhar a aposta com Philéas Fogg” . No último minuto, onde foi parar o certificado sanitário que permitia aos passageiros desembarcar em São Francisco? O nervoso atropelou Nellie Bly . Mas o documento foi encontrado entre os papéis de bordo.

Foi recebida como uma heroína:

“I only remember my trip across the continent as one maze of happy greetings, happy wishes, congratulating telegrams, fruit, flowers, loud cheers, wild hurrahs, rapid hand-shaking and a beautiful car filled with fragrant flowers attached to a swift engine that was tearing like mad through flower-dotted valley and over snow-tipped mountain, on–on–on! It was glorious! A ride worthy a queen. They say no man or woman in America ever received ovations like those given me during my flying trip across the continent.”

A travessia do continente indo para NY se realizou como em um sonho, ovações, discursos, flores, nada era bom demais para recebe-la, para saudar não somente a mulher, mas a primeira pessoa a fazer a volta ao mundo em tão pouco tempo!

Nellie Bly termina assim sua narrativa:

 “The station was packed with thousands of people, and the moment I landed on the platform, one yell went up from them, and the cannons at the Battery and Fort Greene boomed out the news of my arrival. I took off my cap and wanted to yell with the crowd, not because I had gone around the world in seventy-two days, but because I was home again.”

Um selo foi criado em sua homenagem.

Nós também, Nellie Bly, as feminstas do tempo presente, rendemos homenagem a seu percurso de aventureira, à sua coragem, seu humor, sua perseverança na luta pelos direitos das mulheres, para  a transformação da representação social do feminino que , por sua ação,  foi efetuada. Você não será esquecida!

Elizabeth Cochrane, alias Nellie Bly,  viveu plenamente sua vida como bem lhe aprouve. Mas uma pneumonia levou-a com 57 anos.

Referências :

Adler, Laura. 1979. À l´aube du féminisme, les premières journalistes, Paris :Payot.Backhouse,

Bonilha, Caroline. O Corymbo: um jornal feminino no Rio Grande . SÉCULO XX . http://www.ufpel.edu.br/cic/2009/cd/pdf/CH/CH_00686.pdf consultado em 24 janvier 2012

Cunha, Maria Clementina Pereira da.1989.Loucura, gênero feminino, Revista Brasileira de Historia, SP, v. 9.n.18.pp121-144

Foucault, Michel. 2001- Histoire de la folie à l’âge classique 1961 /1972 , Le Foucault élétronique, Folio Views

Novaes Coelho, Nelly, A Emancipação da Mulher e a Imprensa Feminina (séc. XIX – séc. XX) da USP – Universidade de São Paulo http://www.kplus.com.br/materia.asp?co=119&rv=Literatura consultado em 24 janvier 2012

Figueiredo Souto, Bárbara. Feminismo Tipográfico: mulheres em luta na segunda metade do século XIX . http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300453211_ARQUIVO_TextoparaAnpuh2011.pdf  consultado em 24 janvier 2012

Backbone,Frances. 2 000. Women of the Klondike, Toronto, Whitecup Books

Rouquier . Annie, 2008 « Anne Renoult, Andrée Viollis, Une femme journaliste », Genre & Histoire [En ligne] , n°2 | Printemps 2008 , mis en ligne le 13 juillet, Consulté le 23 janvier 2012. URL : http://genrehistoire.revues.org/index302.html consultado em 24 janvier 2012

 

 

Notas  

[i] Entre outras, cito o exemplo de ´Andrée Viollis (Rouquier, web) Julie-Victoire Daubié ( 18241874). As mulheres criaram igualmente jornais. Na França (Adler, 1979), por exemplo, ver La Citoyenne (1881) La voix des femmes, et La Fronde (1905), publicação que chegará os  200 000 exemplaires.No Brasil,  O Jornal das Senhoras, O Sexo Feminino , A Mulher, A Mensageira O Miosótis; O Jornal das Moças, A Palavra, Escrínio e Corymbo. Este último foi publicado  de 1883 à 1944, no Rio Grande do Sul. ( Bonilha ; Novaes Coelho, Figueiredo Souto (web)

[ii] Ver Ulla Wikander, Alice Kesser-Harris et Jane Lewis. 1995. Protecting Women : Labor Legislation in Europe, United States and Australia , University of Illinois, USA

[iii] Chantal Antier Les femmes espionnes dans la guerre (1914-1918) Editons Ouest France. Ver também  http://rha.revues.org/index1963.html#tocfrom1n7

 ver também Edith Calwell, et tant d´autres, inc

[v] Voir Evgenia S. Ginzburg..1997. Le vertige, Paris:Ed. Du Seuil 2 tomes.

> [vi] As citações não tem número de página pois o livro foi consultado onlilne , no  http://digital.library.upenn.edu/women/bly/madhouse/madhouse.html

[vii] A pesquisa de  Maria Clementina Pereira da Cunha nos arquivos do  Juquery , hospital psiquiátrico de São Paulo teve como resultado um excelente livro: O espelho do mundo, Juquery, a história de um asilo, São Paulo :Paz e terra, 1986

 

tania navarro swain